A PILHA
Incluindo a esperança de Liberdade,
ainda que tardia.
Leon Alfonsin Vagliengo
Olho em volta de mim, tentando descobrir algo que me
inspire para escrever uma boa história. Estou em meu pequeno escritório, onde
se encontram muitos objetos apropriados para o local, como canetas, lápis,
réguas, computador, livros, impressora etc., mas nada disso me parece sugestivo
para a elaboração de algum texto interessante. Minha imaginação é uma noite
escura, nenhuma ideia a ilumina.
Finalmente, uma
porta se abriu deixando entrar a luz do pensamento, quando meu olhar pousou
sobre uma enorme pilha de papéis. Nela, documentos bem recentes, amontoados
sobre outros, antigos, alguns até muito antigos, concorrem para produzir em mim
um desalento crônico, uma impressão desagradável de que nunca me libertarei de
seu jugo cruel. Encontrei a minha estrada, passo a percorrê-la.
Alguns
desses documentos representam pagamentos inadiáveis, exigindo total prioridade;
são processados assim que chegam e imediatamente mudam de categoria,
juntando-se a outros porque trazem informações para registros contábeis e
elaboração de relatórios. Os piores, porém, são aqueles que representam
problemas que precisam ser solucionados, mas parecem não ter solução. Estes ficam,
ficam... e ficam.
Entre esses papéis, existe até uma folha com vinte selos
postais, que deverão ser utilizados para o envio de cartas pessoais que não
consegui tempo para escrever. Seriam várias, não escrevi nenhuma até agora. Um
dia ainda as escreverei, e farão parte de um interessante e simpático treino de
redação idealizado pela professora de escrita literária, com a utilização de um
recurso que hoje já se tornou arcaico, mas assume, neste contexto, uma
conotação saudosista quase poética.
Ah! A escrita literária!
Que vontade de retomar e completar cada um dos rascunhos
de histórias que tenho acumulados em arquivos de meu computador! Ou, de
escrever todos os textos semanais recomendados nas aulas! Mas não tem sido
possível, o tempo é escasso, as preocupações rotineiras desviam os meus
pensamentos, muitas vezes escravizam o meu cérebro.
Apesar de tudo, ainda tenho encontrado algum tempo para o
prazer de escrever alguns textos. Não consigo fazer muitos, mas não desisto.
Sempre sai algum, e assim vou levando.
Porém, a
grande pilha, simbolizando tantos afazeres de que não consigo dar conta,
continua sempre lá, impiedosa e ostensivamente, para que eu a veja todos os
dias.
No início, constatar o seu contínuo crescimento me
desesperava. Com o passar do tempo, porém, a habitualidade em vê-la foi criando
em mim uma espécie de calo mental, fui desenvolvendo naturalmente defesas
psicológicas que me permitem, hoje, conviver tranquilamente com as suas
pendências, sem mais pesar em minha consciência o fato de não conseguir
extingui-la.
Muitas vezes
penso nisso e fico com a sensação de que me tornei um sem-vergonha.
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