Marilda
Christianne Vieira
O Sol estava
alto, Marilda vinha caminhando a passos largos pela calcada, preocupações assolavam sua mente. Com certeza
seria um dia complicado, teria que escolher sobre qual caminho deveria seguir
dali para frente. Mudar de cidade, e trabalho era uma atitude bem radical e
definitiva. Não se sentia confortável, seus instintos a alertavam que não seria
feliz. Mas, se comprometera com Henrique, seu noivo, ele seria transferido.
Pensava enquanto caminhava. Como poderia dizer não a
ele?! Eles namoravam há cinco anos, fizeram muitos planos. Num passe de mágica
haviam desparecido. Perguntava-se se realmente o amava? Talvez estivesse
acostumada, desde que esse assunto rondava seus dias, ela vivia tensa, e as
noites mal dormidas, pioravam ainda mais seu humor.
Marilda se sentia desanimada, ainda mais
por ter guardado um segredo sobre sua origem.
Sabia que não conseguiria enganá-los para sempre. Quanto mais se
aproximava, seu possível casamento, inevitavelmente teria que contar a verdade.
Sabia que tinha sido fútil, e desonesta,
ao esconder sua historia, mas depois de tantos anos, como poderia contar?
Sempre que falava de seus pais, dizia que
estavam viajando para o exterior, montara um
álbum de fotos, de uma vida que não era a sua.
Ele acreditou nas mentiras dela, por
terem amigos parecidos, que mal tinham
contato com seus filhos. Naquele mundo artificial, tudo era possível. As mentiras
se avolumaram de uma forma, que não
tinha como voltar atrás.
No ultimo mês, conhecera Raul, seu colega de trabalho, a amizade entre eles se estreitara devido ao
projeto que comandavam juntos. Ela o achava envolvente, bonito, pensava que ao
seu lado sua vida poderia ser mais dinâmica
e divertida. Há algum tempo estava entediada. Os dias sempre iguais e
monótonos, Henrique sempre se dizia cansado, sem disposição, não saiam juntos,
ou faziam algo interessante, como ir ao teatro ou assistir a um bom filme.
Durante os almoços
com o Raul, seus olhos brilhavam
ao escutar o que fizera no fim de semana, sua vida era muitos mais emocionante.
Mas ela não, ela teria que se mudar para Rondônia, lhe parecia o fim do mundo,
seria ainda mais infeliz. A aproximação
com o Raul lhe deixara com muitas duvidas sobre a sua vida.
Conhecer Raul,
parecia uma oportunidade de recomeçar uma nova vida longe de tudo isso, sem
mentiras. Ele era uma pessoa simples, com uma vida parecida com a dela. Teria a
chance de ser ela mesma.
Aproveitando da situação que se encontrava, deveria
romper com Henrique, culpando a transferência de cidade, ou talvez, mesmo sendo
cruel, dizer que havia conhecido outro homem. O que em parte era a verdade.
De qualquer forma, ela o magoaria, e tinha que se
preparar para isso. Combinaram de se encontrar a tarde. Ele muito empolgado
pela oportunidade no trabalho, discorria
seus planos, sobre a mudança , e o casamento, Marilda, estava atônita, não
sabia o que responder. Tentava em vão mudar de assunto, Ela ao contrario, sentia
dor no estomago, enxaqueca, um mal estar generalizado.
Disse que precisava descansar, Henrique estranhou os
constantes desencontros, e sentia que alguma coisa ela devia estar escondendo.
Perguntou se ela precisava de ajuda, e como ela disse que não, foi para casa
aborrecido.
Durante mais uma noite de insônia, Marilda resolveu que
logo pela manha, resolveria a situação.
Ligou logo cedo para Henrique e disse que gostaria de
falar com ele na hora do almoço, pediu para ele ver a sua agenda e retornar
assim que pudesse.
Ele foi buscá-la, e durante o trajeto até o
restaurante, ela foi dizendo que não andava bem, e que estava pensando em adiar
o casamento. Henrique parou o carro na primeira vaga que encontrou, estava
indignado, de forma muito grosseira, perguntou se era brincadeira?
Marilda, encolhida atrás de sua vergonha, disse que
não, não era uma brincadeira, havia tomado uma decisão, que há muito tempo
deveria ter sido tomada.
Abriu a porta, energicamente, e a bateu
com forca, saiu andando rapidamente pela calçada, sem olhar para trás.
Nos dias seguintes, não atendeu as ligações dele, bloqueou seu contato.
Henrique, estranhando tais atitudes, foi esperá-la na
saída do trabalho, quando então a viu conversando sorridente com Raul.
Sem que ela o visse, saiu apressado, entrou no carro e partiu em disparada. Quando ao virar a
rua deu com um caminhão carregado, e em instantes, seu mundo se apagou.
Foi um grande
acidente. Levado pelo pelos socorristas ao hospital mais próximo, lá permaneceu inconsciente, na UTI. Sua
família foi avisada. Abalados, permaneceram no saguão aguardando o boletim médico,
ou informações a seu respeito.
Ao amanhecer ligaram para Marilda contando sobre o
acidente, ela imediatamente se encaminhou para o hospital, tomada de culpa, não
conseguia dizer nada. Henrique continuou
em estado, vegetativo durante muitos meses, os médicos não sabiam como, ou
quando ele se recuperaria.
A partir deste dia, ela se apagara para o mundo, apenas
cumpria suas atividades básicas, e rezava muito, para que nunca ninguém
soubesse o que de fato ocorrera. Sentia-se uma pessoa péssima, em seu intimo,
imaginava o que acontecera, pela proximidade de seu trabalho e o horário do
acidente. Fora longe demais, suas mentiras, e sua ganancia haviam acabado com a vida de seu noivo, que
durante aqueles cinco anos, estivera ao seu lado.
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