É difícil perdoar?
Hirtis
Lazarin
Cresceram juntos, na mesma rua, na
mesma escola, na mesma classe. Leo e
Renato tornaram-se inseparáveis e cúmplices.
Nas coisas certas e nas molecagens.
Tornaram-se hábeis em pular
muros. O preferido era o do orfanato, no
horário em que as freiras e as internas se dedicavam às intermináveis orações
matinais.
O que os atraía era uma mangueira
prodigiosa. Seus galhos carregados de
mangas, envergavam com o peso até alcançar o chão. Era ali que os meninos faziam a festa.
Uma vez por semana, no mínimo, iam à
periferia da cidade. Ruas sem calçamento
e esburacadas eram perfeitas para o "rally" de bicicleta. Não havia pneus que resistissem a tanto
sofrimento.
Nos estudos, as aptidões tomaram
rumos diferentes.
Renato brincava com a
matemática. "Debaixo dos caracóis
de seus cabelos" havia uma mente onde os números pipocavam. O rapaz, com destreza, jogava-os pra cima,
deixava outros caídos ao chão pedindo socorro, encaixava um "x" aqui,
eliminava o "y" trapalhão, arredondava a raiz quadrada e a equação
estava resolvida. Seu jeito de lidar com
as ciências exatas refletia no seu jeito de vestir. Gostava de calça social, camisa bem passada e
sapatos intocáveis no brilho.
Leo era descolado. Vivia de jeans desbotado, camiseta e tênis
desamarrado. Era o artesão das palavras. Juntava palavras aqui, eliminava outras ali,
encaixava algumas roubadas de Machado de Assis, copiava outras do vocabulário
de Suassuna, inventava muitas inspirado em Guimarães Rosa. Embaralhava estilos e no papel surgia uma
obra de arte. Houve tempo em que andava
pra baixo e pra cima com Fernando Pessoa.
Deu pra escrever poesias.
Os dois já rapazes, se complementavam
como o côncavo e o convexo. A lealdade
entre os dois era coisa bonita de se ver.
A lealdade leva tempo pra se instalar.
Só acontece quando há verdade, entrega e sinceridade no relacionamento.
Leo tornou-se responsável por uma
coluna no jornal da cidade. E, pra
socorrer os pais em dificuldades financeiras, aceitou trabalhar num editora
fazendo traduções do português para o inglês e vice-versa.
Nesse período Leo afastou-se das
festas e diversões e sobrava pouco tempo pra namorada Helena. Era Renato quem, muitas e muitas vezes,
acompanhava-a às festas. A juventude
quer a felicidade a qualquer custo.
Parece que o mundo está prestes a acabar. Não há tempo pra perder.
Bem, o tempo passou... As pessoas
mudaram... A vida também.
A situação financeira da família de
Leo foi resgatada e ele, nos próximos dias, deixaria a editora pra cuidar da
própria vida. No momento, o vestibular e a Helena eram sua prioridade.
Enfim chegou o seu primeiro final de
semana livre. Sabia que Helena passaria
alguns dias fora. Procurou Renato e não
o encontrou. Ninguém sabia informar seu
paradeiro. Nem seus familiares. Achou estranho. Um sempre sabia do outro.
Uma semana inteira passou e Leo
recebeu um postal. Helena e Renato
estavam juntos. O convívio entre os dois
foi transformando amizade em amor. Foi evitado,
negado, mas não teve jeito.
Aconteceu. E era amor de
verdade. Foram leais e fiéis até quando
deu.
Difícil foi contar a verdade.
Se a amizade vai continuar, não
sabemos. Só o tempo dirá.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
DEIXE AQUI UMA MENSAGEM PARA O AUTOR DESTE TEXTO - NÃO ESQUEÇA DE ASSINAR SEU COMENTÁRIO. O AUTOR AGRADECE.